Eu
nunca aceitei a simplicidade do sentimento. Eu sempre quis entender de
onde vinha tanta loucura, tanta emoção. Eu nunca respeitei sua
banalidade, nunca entendi como pude ser tão escrava de uma vida que não
me dizia nada, não me aquietava em nada, não me preenchia, não me
planejava, não me findava. Nós éramos sem começo, sem meio, sem fim, sem
solução, sem motivo. Não sinto saudades do seu amor, ele nunca existiu,
nem sei que cara ele teria, nem sei que cheiro ele teria. Não existiu
morte para o que nunca nasceu. Sinto falta da perdição involuntária que
era congelar na sua presença tão insignificante. Era a vida se
mostrando mais poderosa do que eu e minhas listas de certo e errado.
Era a natureza me provando ser mais óbvia do que todas as minhas
crenças. Eu não mandava no que sentia por você, eu não aceitava, não
queria e, ainda assim, era inundada diariamente por uma vida trezentas
vezes maior que a minha. Eu te amava por causa da vida e não por minha
causa. E isso era lindo. Você era lindo. Simplesmente isso. Você, a
pessoa que eu ainda vejo passando no corredor e me levando embora,
responsável por todas as minhas manhãs sem esperança, noites sem
aconchego, tardes sem beleza. Sinto falta de quando a imensa distância
ainda me deixava te ver do outro lado da rua, passando apressado com
seus ombros perfeitos. Sinto falta de lembrar que você me via tanto,
que preferia fazer que não via nada. Sinta falta da sua tristeza,
disfarçada em arrogância, em não dar conta, em não ter nem amor, nem
vida, nem saco, nem músculos, nem medo, nem alma suficientes para me
reter. Prometi não tentar entender e apenas sentir, sentir mais uma vez,
sentir apenas a falta de lamber suas coxas, a pele lisa, o joelho, a
nuca, o umbigo, a virilha, as sujeiras. Sinto falta do mistério que era
amar a última pessoa do mundo que eu amaria. (Tati Bernardi)
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